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Há mais 26 anos , apresento um programa de rádio intitulado "Canta Minas", na rádio Aranãs FM, de Capelinha MG, com enfoque para a música mineira em todas suas vertentes. Sempre fui apaixonado por música e rádio. Assim sendo, tomei a iniciativa de criar este blog com a finalidade de divagar um pouco sobre as minhas impressões durante os mais de 20 anos de programa. Além da música também sou apaixonado por História e Literatura. Aqui, publicarei crônicas, causos e outras lorotas a respeito de tudo que tenho vivido nesse pedaço de chão que é o Vale do Jequitinhonha. E como não pode deixar de ser, também escrevo sobre a minha querida terra natal, Corinto, e outras vivências pelo mundo afora que me ajudaram a construir uma história de gente comum, sem heroísmos, no entanto carregada pelos "sinais de humanidade"!!! Abraços Gerais!!!

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sexta-feira, 28 de novembro de 2014

O CANTO QUE VEIO DO FUNDO MAIS FUNDO DO VALE

"Ao perguntar ao maestro Lindomar Gomes o que o levou a apostar num coral desconhecido a ponto de convidá-lo para um evento tão grandioso tendo como referência apenas uma singela página de internet criada por mim, respondeu: 'a simplicidade e pureza'. E ao perguntá-lo novamente se isso por si só isso já seria suficiente para emocionar as pessoas a ponto de levá-las ao choro, ele novamente me respondeu:
'o coral de Veredinha toca o coração das pessoas porque canta com o fogo do amor'”.


 O coral em sua primeira apresentação no Museu Abílio Barreto/Bh em 2004.
Foto: Arquivo Canta Minas

Por Tadeu Oliveira

Assim, se passaram dez anos”. Mas parece que foi ontem. Outro dia mesmo, o Coral Vozes das Veredas, dava os seus primeiros passos para cantar em outras plagas. Após três anos da sua fundação, eis que surgia uma oportunidade ímpar de participar do 2º Festival de Corais de Belo Horizonte, nos dias 26, 27 e 28 de novembro 2004, que homenageava o Clube da Esquina. O convite fora feito pelo idealizador e realizador do evento, o maestro Lindomar Gomes muito bem definido pelo poeta Fernando Brant como “um singelo encantador de notas musicais e de pessoas, que leva a vida sonhando e realizando sonhos”. O convite veio a calhar e nós audaciosa e despretensiosamente aceitamos. Afinal, desde a sua criação pela Adecave – Associação de Desenvolvimento da Criança e do Adolescente de Veredinha – em agosto de 2001, que o Coral cantava e encantava o Médio Jequitinhonha. As cidades de Capelinha, Turmalina, Minas Novas, Berilo e Francisco Badaró já haviam se embevecido com as melodias e harmonias emanadas pelas vozes de Veredinha.

A euforia e a ansiedade tomavam conta de nós naqueles dias. Eu e Mirinha, uma das coordenadoras do projeto da Adecave, cuidávamos dos preparativos para o grande evento buscando apoio e recursos para logística, escolhendo repertório, convidando músicos para acompanhar o coral, organizando ensaios e realizando oficinas com abordagens comportamentais e relações interpessoais com a psicóloga Lílian Murta. Até que chegou o dia de tomarmos o rumo da capital mineira para lá cantarmos pela primeira vez. Se para mim que apesar de já ter morado em Belo Horizonte nos anos de 1980 sentia-me como estivesse entrando num território desconhecido, imagine o que aquilo tudo poderia representar para aquelas crianças com idade entre sete e dez anos que mal conheciam os arredores de Veredinha!

A nossa primeira participação aconteceu na noite do dia 26 de novembro de 2004, sexta-feira, no museu Abílio Barreto após percorrermos por um dia inteiro os quase 500 km que separa Veredinha de Bh. Assim que chegamos com aquele bando de crianças com roupas em algodão cru, Mirinha e eu nos entreolhamos e sussurrei entredentes: – “Meu Deus do céu! O que viemos fazer aqui?” – acompanhado de um enorme frio na barriga e um aperto no coração. Mirinha corroborou meus sentimentos acrescentando que devíamos nos manter serenos para não transparecer qualquer insegurança. Não saberia precisar quanto tempo passou desde nossa chegada até a hora de nos apresentar. Foram momentos tensos e aflitivos. O ambiente tornara-se contraditoriamente inóspito apesar da beleza do Museu Abílio Barreto com seu casarão colonial e da recepção carinhosa e calorosa do maestro Lindomar Gomes e sua equipe. Nosso figurino, confeccionado em tecido próprios para sacos e com detalhes em chita colorida e totalmente diferente dos padrões adotados pelos corais que se via por ali, nos expunha ainda mais aos olhares curiosos. Outro fator altamente inibidor era o público presente, bem diferente daquele os quais já havíamos apresentado.

Logo que subimos ao palco, como um coro de anjos mestiços, o sublime cantar das meninas de Veredinha enfeitiçou os presentes.  Iniciamos com dois cânones que sempre abrem nossas apresentações: “Oração Indígena” e “Saudação Africana”. Como fumaça, os receios se dissiparam e logo seguida a gente cantou “Cantiga pra Lira” de Rubinho do Vale. Faltava ainda cantar uma música do Clube da Esquina e quando o coral cantou “Itamarandiba” de Milton Nascimento e Fernando Brant, a plateia já nos ovacionava. Plateia esta que contava com a presença do poeta e compositor Fernando Brant que naquela semana, mais precisamente no dia primeiro de dezembro de 2004, escreveria muitos elogios ao Coral de Veredinha na sua crônica semanal no jornal Estado de Minas, intitulada “Música nas esquinas e nas praças”, que mais tarde integraria o livro “Casa Aberta” pela editora Dubolsinho.

Brant, Márcio Borges, Murilo Antunes e Toninho Horta
Vivenciamos ainda muitas outras emoções. Eu e o músico Fábio Cordeiro assistimos a um animado bate papo sobre o Clube da Esquina com Toninho Horta, Fernando Brant, Márcio Borges, Murilo Antunes, integrantes do movimento, no Espaço Cultural Phoenix da Universidade Fumec. E na companhia dos músicos Toninho Iglésias e César Loredo nos inebriamos aos sons do grupo carioca Equale, Affonsinho, Tavito, Telo Borges, Toninho Horta, 14Bis e Trio Amaranto na praça de Santa Tereza e na praça em frente a igrejinha da Pampulha.

Aliás, estas duas praças nos reservaram momentos jubilosos e extasiantes. Durante o dia, só se ouvia falar do coral e várias pessoas nos acompanhavam por onde fôssemos cantar. Na noite do dia de 27 de novembro o enorme público na Praça Duque de Caxias, em Santa Tereza, foi ao delírio na apresentação do Coral Vozes das Veredas. E lá, nos despedimos do Festival e agradecemos o carinho do público e dos organizadores, pois no dia seguinte o coral participaria do programa televisivo Dedo de Prosa, do capelinhense Juninho Elisiário, e faríamos um passeio com as meninas num shopping acatando sugestão de Rubinho do Vale. Para nossa surpresa, mal o programa terminou duas belas moças da organização do festival nos esperava e nos “intimou” a comparecer à praça da igrejinha da Pampulha por ordem do público presente. Não é preciso dizer que as crianças rejeitaram a ideia. Ao argumentar que, se nos propusemos a participar do Festival, deveríamos acatar o pedido, meu argumento as levou a irredutibilidade. Então, tive que apelar para os versos do poeta que diz que “todo artista tem de ir aonde o povo está”.

Cantando na Pampulha
Mal descemos do ônibus na Pampulha e ouvimos o locutor anunciar entusiasticamente: “acaba de adentrar a praça o coral de Veredinha”. A praça foi ao delírio transformando as expressões carrancudas dos rostos infantis em largos sorrisos. Após o desfile de inúmeros corais pelo palco, antes do 14Bis fechar as cortinas do 2º Festival de Corais, as Vozes das Veredas incendiou o público. Surgia assim, para o cenário do canto coral de Minas Gerais, um canto novo do cantinho mais fundo do fundo do Vale do Jequitinhonha. 

Fernando Brant, Tadeu Oliveira e
o maestro Lindomar Gomes
Primeiro coral do Vale a cantar nesse evento, a história das Vozes das Veredas se entrelaçou à história do Festival de Corais de Belo Horizonte que se transformou no FIC - Festival Internacional de Corais. E minha trajetória pessoal no canto coral ganhou novos caminhos e experiências. Um dia, ao perguntar ao maestro Lindomar Gomes o que o levou a apostar num coral desconhecido a ponto de convidá-lo para um evento tão grandioso tendo como referência apenas uma singela página de internet criada por mim, respondeu: “a simplicidade e pureza”. E ao perguntá-lo novamente se isso por si só já seria suficiente para emocionar as pessoas a ponto de levá-las ao choro, ele novamente me respondeu: “o coral de Veredinha toca o coração das pessoas porque canta com o fogo do amor”. Isso explica a minha grande paixão por este grupo de meninas, pela cidade de Veredinha e pelo Vale do Jequitinhonha. E para finalizar, assim como iniciei esse texto com o primeiro verso de uma versão de Lourival Faissal para a composição de Rafael Hernández cantada pela baiana Gal Costa, encerro com o último verso da mesma canção: “E o resto desse romance só sabe Deus”.